quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

O Maestro do Canão

Primariamente, sou defensor da ideia de que quem gosta de música deve conhecer todos os gêneros. Digo isso em relação aos roqueiros ortodoxos, que ficam presos ao estilo, perdendo a oportunidade de ouvir muita música boa de outros estilos. Nessa mesma linha de pensamento, admito que sempre achei o Rap muito interessante, especialmente o aspecto crítico/sociológico que as letras carregam (pelo menos do "bom rap", ao contrário de vários rappers que só sabem cantar músicas que ostentam riqueza). Assim, sempre gostei bastante de Public Enemy, Run DMC, Beastie Boys (R.I.P MCA) e é claro, Sabotage.


Enfim, poderia escrever linhas e linhas falando sobre a morte de Sabotage, a produção de seu filme, os filmes que o Rapper participou, o absurdo que foi seu assassinato, mas como isso (ainda) é um blog de música , vamos falar sobre a métrica e conteúdo de suas letras, e o legado que o rapper deixou. O "Maestro do Canão" tinha um modo único de compor, onde usava poucas conjunções em suas frases, além de rimar palavras com palavras diretamente, não se prendendo muito ao estilo "rima somente ao final de estrofe". Ex:

Verdade Brown o gosto tá cruel o crime não é mel
O medo vem do céu como foi cruel
 De arrec-cléu click-cléu o povo é algo fel  (Mun-rá)

Seu único álbum lançado, Rap é Compromisso (2001), indica certa maturidade para o cenário de Rap nacional, vez que não falava sobre prisão, tráfico e demais rótulos que infelizmente (e também erroneamente) são atribuídos ao rap, mas dizia sobre libertação - e libertação pelo rap! Em várias músicas, Sabotage deixa claro que a criminalidade não compensa, e pauta pela construção de uma comunidade melhor. Na faixa-título Rap é Compromisso, Sabotage conta a história de um criminoso, e todas as mazelas qual o mesmo se passava. O nome se tornou um jargão entre fãs de rap (assim como "Respeito é pra quem tem")


Não só versando sobre sua libertação do crime pelo rap, o rapper também denuncia alguns episódios de agressão pela polícia, e como as pessoas de situação financeira desfavorável são vistas pelo Estado. Além disso, em Cocaína o rapper diz sobre os perigos da droga. Ao todo, o autor utiliza de assuntos realmente relevantes, de modo que as suas rimas não só sejam combinações tônicas, mas também que toquem o ouvinte, seja pela beleza da métrica, seja pelo conteúdo da letra.

Hoje, completando 10 anos de sua morte, o cenário do rap nacional lamenta sua falta. Vemos em ascensão Emicida, Criolo, dentre outros, e podemos ver claramente a influência do senhor do Canão. Se o rap nacional hoje é visto de outro modo, muito disso é devido ao trabalho de Sabotage (e Racionais também, é claro). Por mais que isso pareça clichê, Sabotage ainda vive no rap, e ainda viverá por muitos anos, como um dos ícones e um exemplo a ser seguido. O rapper mesmo no auge não fugiu de suas origens, mantendo sua humildade e a preocupação em deixar o lugar onde morava melhor - mesmo com sua única arma, o rap.