terça-feira, 7 de junho de 2011

Restou o Kaos

De todas as bandas que fizeram parte de minha vida, dificilmente uma teve uma participação tão sólida como o Anarkaos. Além de ser uma banda da minha cidade, o conjunto representava a mistura das minhas próprias influências musicais e a prova viva em que uma cidade do interior poderia ter sim uma banda de rock maneiro, sem que ficasse eternamente tocando cover de bandas mainstreams do momento. No fundo, todo mundo acabava se identificando com um trecho ou outro das músicas, já que de certa forma, o (contra)cotidiano era muito parecido.

Como se fosse hoje mais cedo, lembro do primeiro show que fui do Anarkaos. Foi em 2006, no extinto Jazz Bar, no lançamento do segundo disco da banda. Antes disso, eu já tinha ouvido falar (é claro), mas pensava que era algo totalmente diferente, até porque todos citavam a banda como "a banda em que o Paulo professor do Anglo toca". Possivelmente até hoje não teria tanto apreço pela banda, mas não me lembro quem me disse que "eles gostavam muito de Cure". Isso foi a palavra-chave. Eu estava no meu período mais doente-maníaco por Cure, qualquer coisa que tivesse uma ligação mínima com a turma do Robert Smith eu estaria topando! Se não me engano, os ingressos eram gratuitos, distribuídos aonde o guitarrista Adriano trabalhava. Fiz grande parte dos meus amigos irem no show comigo - estavam achando ótimo, éramos/somos todos quebrados e é muito raro ter show em Formiga, principalmente de graça.

E assim fomos nós, uma pequena turminha (um embrião do que hoje chamamos de "turma da praça", ou até mesmo MK Vera) em busca de música boa. Eu, motivado pelo "instinto Cure"; meus amigos para curtir o show mesmo. Sei que quando começou o show  fui reconhecendo alguns membros da banda (como o Branco, e até mesmo o Tucano que fez uma pontinha em uma canção) e vi que não era beeem algo parecido com Cure [exceto o 'Smith' do apelido da Ju]... mas mesmo assim era algo que era muito, muito massa. Foi a mesma sensação que tive quando ouvi T-Rex pela primeira vez: ouvi pensando que seria uma coisa, fiquei surpreso ao ver que não era o que pensava que fosse, e acabei gostando de verdade por achar o que eu estava ouvindo na hora muito bom. Saí de lá elogiando o show até não poder mais, assim como meus amigos que estavam comigo.

Não sei se eu e o Lalinho exageramos demais ao elogiar, mas sei que falamos tanto do show pros outros que no próximo show, já conseguimos arrastar mais gente para ir assistir com a gente . Nesse período de tempo, já tínhamos decorados várias letras (Soul Underground era obrigatória), e de tanta propaganda que fazíamos, a galera ficava todo dia entrando no fotolog (nessa época era fotolog!) da banda esperando o aviso de um show novo. Os Planctons já haviam se tornado algo sério (desde sua aparição na estreia do segundo disco), e essas "duas" bandas definitivamente matavam o tédio de uma certa juventude de uma cidade do interior que não tem nada para fazer a não ser comer ou falar da vida dos outros.

Bom, acho que eu poderia ficar aqui até amanhã  falando sobre os casos que envolvem eu+minha turma e o Anarkaos ( são muitos mesmo, como o show no caminho da roça, o cover do Rage [tinha tirado meu siso dias antes desse show, arrebentei todos os pontos no dia], o Formiga Sônica, aliás, o próprio ato de frequentar o Novo Paladar) , mas em especial eu gostaria de Ressaltar o surgimento do Movimento Kill Vera. Graças ao Anarkaos (e a mãe do PM) , a minha turma de amigos, de fato, começou a existir. O que começou como uma brincadeira acabou virando uma turmona de gente, mesmo. E é claro, o Anarkaos era uma espécie de padrinho pra gente.

Por mais que isso pareça idiota ou infantil, realmente existia o sentimento de identidade. Era só falar que tinha um show da banda, que todo mundo aparecia em Formiga para assistir. Soul Underground ainda é nosso hino, creio que sempre será. Tínhamos (temos, na verdade) um enorme apreço por todos os membros da banda, tanto que todo mundo sabe falar no que e em que tal membro é mais massa. Apesar de todo mundo ter crescido pra caramba nesse tempo, algumas coisas, nem que seja por nostalgia, ainda ficam. Sempre ficam.
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Acabou que eu falei demais aqui, nem comentei sobre o disco e...


O dia que fomos informados que a banda ...é... 'não seria mais a mesma' , soou como se alguém tivesse morrido. O pessoal escutou o CD, que para a gente ficou entendido como um presente de despedida, na sensação de que era o último adeus de algo que marcou tanto o final da nossa adolescência. Sabemos que as coisas vão um pouco mais além, que nem tudo está acabado, mas mesmo assim, foi como se todo mundo sentisse as dores de uma separação. O tom sombrio de algumas músicas, a guitarra ausente em outras, a sonoridade clean (que vai além de somente nome) expressa uma espécie de adeus.

Com todas as pessoas que cheguei a comentar, houve um consenso: o terceiro disco é o melhor álbum da banda. Creio que cada pessoa pode fazer sua própria interpretação sobre as músicas (talvez isso seja a própria intenção de Branco, Warlen, Adriano e Paulo), mas eu fiz pequenas divagações em quase todas as faixas do disco. Ainda não sei definir qual foi a minha faixa favorita (Luto 777 é tão marcante, ao mesmo tempo que o Ministro do Funk dá vontade de arrebentar a rotina de verdade e Opala Capa Preta é tão.... junk town nothing got to keep it coming, hipshake gunning kick start and I'm running, se é que me entende... droga, lembrei do riff principal de Lesgo Lesgo... realmente é difícil), esse disco foi realmente uma obra de arte. Como já disse, somente senti falta de uma guitarra em algumas músicas, e de alguns backvocals da Ju, mas... isso não tira a beleza do disco.


Acho que , no final de tudo, sobrou só agradecer ao Anarkaos - pelo (s) disco (s), pelo carinho que tiveram com a gente durante todo esse tempo, com a paciência por ouvirem "soul underground! soul underground!" em todo santo final de show, por aguentar canseira da gente perguntando quando teria um show novo, pela imaturidade de não aceitarmos as coisas direito sem sabermos dos fatos concretos, por fazer um lugar semi-abandonado virar um "pub" da cidade, por aturar encheção de saco seja ela na rua, na internet , nos shows, por ser um motivo de reunião de amigos ausentes na cidade (inclusive eu), por fazer a nossa vida tão mais feliz nas madrugadas dos sábados em que vocês tocavam.


Fez efeito!